Privilégios Régios numa majestosa visita de Estado
SABIA QUE…
O acervo do Museu Nacional dos Coches esteve ao serviço do Cortejo de receção de Isabel II – Rainha de Inglaterra, em visita a Lisboa, no ano de 1957.
Rainha Isabel II, na visita a Lisboa, em 1957. A Monarca desloca-se na Carruagem da Coroa pertencente à coleção de viaturas do Museu Nacional dos Coches, Inventário V 0043.
Aproximadamente um mês antes desta emblemática receção de Estado, inserido no lote de correspondência do Museu Nacional dos Coches de 9 de Janeiro de 1957, dava entrada um ofício dirigido a Augusto Cardoso Pinto, Diretor deste Museu.
Neste documento, recebido via Ministério da Educação Nacional – Direção-Geral do Ensino Superior e das Belas Artes, eram “superiormente” requeridos diversos Bens, outrora ao serviço da Família Real Portuguesa e à data musealizados nesta instituição:
Exmo. Senhor Director do Museu Nacional dos Coches
A fim de que Vossa Exª. se digne informar-me do que tiver por conveniente acerca do assunto, transcrevo o ofício nº 17, de 5 do corrente, da Secretaria Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo:
“Tenho a honra de solicitar a Vossa Excelência a necessária autorização para a cedência da carruagem da Coroa, arreios, uniformes e demais acessórios, que deverão ser utilizados por ocasião da próxima visita a Lisboa de Sua Majestade a Rainha Isabel II, a fim de que a Guarda Nacional Republicana possa começar a efectuar, quanto antes, os indispensáveis exercícios de ensaio.”
A bem da Nação
Direção-Geral do Ensino Superior e das Belas Artes, 8 de janeiro de 1957
Desta forma, cumprindo a instrução imposta pela comissão organizadora, “a bem da Nação” mas contra a sua convicção de Conservador de coleções e de acérrimo defensor do recato dos bens preservados neste “seu” Museu, Augusto Cardoso Pinto vê-se na obrigação de disponibilizar o referenciado acervo.
Como comprovam as guias de entrega e receção assinadas pelo funcionário do Museu João Rodrigues, nas datas de 7 e 20 de Fevereiro de 1957, ficariam à disposição do Comando Geral da Guarda Nacional Republicana os seguintes “objectos”:
5 Pingalins;
5 canhões para botas de sota;
4 Pingalins para cocheiros (possivelmente chicotes);
4 Fardamentos completos de Cocheiro;
5 Fardamentos completos de Sota;
22 Fardamentos completos de trintanário;
26 Pares de sapatos;
4 Plastrons;
22 Laços Brancos;
26 Pares de meias;
21 Mantinha de Sela;
5 Mantinha de Sela de Sota;
26 Freios completos;
26 Bridões;
8 Arreios da Carruagem da Coroa;
6 Arreios da Carruagem da Coroa (simples) completos;
6 Arreios meia cana (completos) ;
6 Arreios girassol;
10 Fechadores;
5 Pares de estribos amarelos;
1 Guarda-pernas;
Carruagem da Coroa com respectiva lança e balancins.
Após a realização deste evento mediático, orquestrado com um claro propósito político, a 20 de Fevereiro de 1957 o referido lote de bens solicitados ao Museu Nacional dos Coches regressava a casa.
Podemos sem dúvida afirmar que terão cumprido a sua missão.
Absorveram e extasiaram as populações urbanas e rurais que em tão grande número se aglomeraram nas diversas localidades por onde, ao longo dos 3 dias, a comitiva da Rainha foi passando.
Esta emblemática cerimónia ficaria registada na memória de quem presencialmente ali se encontrava.Afortunadamente, e graças aos avanços tecnológicos da época, seria igualmente eternizada através das lentes das câmaras e dos inúmeros periódicos à data publicados.
Como conservadores e profissionais de museus, não podemos deixar de prestar a nossa homenagem a Augusto Cardoso Pinto, Diretor do MNC entre 1947 e 1962, reconhecendo a sua determinação e profissionalismo ao oferecer resistência às consecutivas solicitações de utilização funcional dos bens incorporados no Museu.
Esta sua contenda é clara, num documento que dirige à tutela, manifestando expressamente a sua posição:
“As consequências resultantes deste facto estão por demais comprovadas. Por maiores que sejam o escrúpulo e as cautelas postos na preservação dos objetos pelas entidades a que estão cedidos, é impossível evitar qualquer percalço, podendo ocorrer danificações, por vezes irreparáveis, como já tem acontecido.”
Esta seria a última vez em que este conjunto exerceria o seu original carácter funcional, encontrando-se apenas disponível para estudo ou deleite, conservado tanto no percurso expositivo como nas reservas museológicas do MNC.
Rita Dargent
MNC
4 de Fevereiro de 2022
Créditos da Imagem: http://1.bp.blogspot.com/_blepQVvY52g/SWJC2dS_E0I/AAAAAAAABXk/EsGvSgh6qTI/s1600-h/A81CXECA73IIQMCA7BYII2CAAS7ZTQCAZLOZ5GCA7DGM13CAQ4RSTZCA2ZEHB0CA63UQQWCA5RKCOZCAZOKI03CAZMF0V0CAMF11AFCAXH7DJJCA1Z9JNFCA5602OECA6C8N66CA8WAC52CAWNYG1O.jpg